Primeira apreensão de adolescente por tráfico não deve levar à internação

Nova súmula (número 492) editada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabelece que menores de idade apreendidos pela primeira vez por tráfico não devem ser, obrigatoriamente, internados. A decisão causa polêmica e incita debate.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) prevê que a internação deve ocorrer apenas se o ato infracional envolve violência ou grave ameaça à pessoa, se o adolescente é reincidente e cometeu outras infrações graves ou se ele descumpriu, sem justificativa, medida disciplinar anterior (Art. 122).

Para alguns especialistas, portanto, a prática bastante comum entre os juízes de internar adolescentes por tráfico logo na primeira apreensão contraria a Lei.

Ao jornal Folha de S. Paulo, a presidente da Fundação Casa Berenice Gianella afirma que “Juízes, principalmente do interior do Estado, sentem-se pressionados pela sociedade e preferem internar o jovem em vez de tratá-lo”.

De acordo com o jornal, 42,7% da população de internos do Estado de São Paulo cumprem a medida por envolvimento com o tráfico – a decisão do STJ iria contribuir para diminuir em aproximadamente 30% a superlotação da Fundação Casa.

Para outros, a medida estimula a participação de menores de idade no tráfico. Também ao jornal Folha de S. Paulo, o procurador de Justiça Marcio Sergio Christino defende que será mais fácil aos traficantes recrutarem adolescentes para atuar na venda de drogas. “Só basta dizer que ele não vai ser punido e, pronto, seu negócio será mantido”, afirma.

 

Estímulo para uma ação mais qualificada e integrada do Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente (SGDCA)

Na verdade, a súmula 492 do STJ reafirma dispositivo já contido no ECA, sendo, portanto, coerente com o espírito dessa lei e também com as normas e intenções implícitas na lei que instituiu o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE – Lei nº 12.594, de 18 de janeiro de 2012).

Ela estabelece que, além da responsabilização do adolescente quanto às consequências lesivas do ato infracional – sempre que possível incentivando a sua reparação – as medidas socioeducativas devem buscar a sua integração social e a garantia de seus direitos individuais e sociais, por meio do cumprimento de Planos Individuais de Atendimento (PIA).

Esses planos devem criar ou potencializar condições para a restauração da convivência familiar e comunitária saudável do adolescente, e para que cada um deles construa ou reconstrua seu projeto de vida de forma autônoma e cidadã.

Como previsto no ECA, para que as medidas socioeducativas tenham efetividade, é preciso que as instituições do Sistema de Garantia de Direitos (Conselho Tutelar, Segurança, Justiça, Educação, Assistência Social, entre outras) atuem de forma integrada e cooperativa, tendo em vista agir sobre as causas que produzem o envolvimento de adolescentes com o tráfico de drogas, bem como prevenir, reconhecer precocemente e atuar para restaurar os direitos e as condições de vida comunitária saudável dos adolescentes envolvidos em atos infracionais.

 

O que é uma súmula e como funciona

 

As súmulas são um breve resumo da interpretação majoritária de um tribunal e servem para orientar as instâncias inferiores. Elas são editadas quando diversos casos análogos são julgados da mesma forma.

A súmula referida neste editorial não é considerada vinculante. Isso quer dizer que os juízes poderão tomar uma resolução diferente e internar o adolescente. Sua decisão, no entanto, terá de ser muito bem justificada e embasada, uma vez que ela poderá ser modificada quando o caso chegar ao Superior Tribunal de Justiça.

A súmula 492 do STJ diz que “o ato infracional análogo ao tráfico de drogas, por si só, não conduz obrigatoriamente à imposição de medida socioeducativa de internação do adolescente.”