Envelhecimento e saúde: desafios para o Brasil

Equipe Prattein
19/10/2015

A Organização Mundial de Saúde (OMS) acaba de publicar o Relatório Mundial de Envelhecimento e Saúde, no qual propõe um novo conceito de envelhecimento saudável e aponta caminhos para uma reorganização dos sistemas de saúde que seja coerente com as tendências mundiais do envelhecimento da população.

Envelhecimento saudável

Segundo o relatório, as evidências recentes a respeito do processo de envelhecimento ajudam a superar estereótipos vigentes sobre a condição das pessoas mais velhas e permitem redefinir envelhecimento saudável como algo que vai além da ausência de doença. Em 2005, a OMS já havia definido envelhecimento ativo como “o processo de otimização das oportunidades de saúde, participação e segurança, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida à medida que as pessoas ficam mais velhas.” Neste novo Relatório, a OMS define envelhecimento saudável como “o processo de desenvolvimento e manutenção da capacidade funcional que permite o bem-estar em idade avançada.

Ou seja, envelhecimento saudável passa a ser concebido não mais como uma determinada condição de saúde de uma pessoa de certa idade, mas como um processo que se mantém relevante na trajetória de vida das pessoas à medida que elas envelhecem. Esse processo pode se tornar mais ou menos positivo a depender, entre outros fatores, do tipo de cuidado a que as pessoas têm acesso. O relatório dá como exemplos a trajetória de envelhecimento de pessoas com demência ou doença cardíaca avançada, que pode melhorar se elas contarem com cuidados de saúde acessíveis que apoiem e otimizem a sua capacidade.

Investimento e não custo

O Relatório enfatiza que o gasto dos sistemas de saúde com as populações mais velhas deve ser entendido como investimento e não como um custo. Isto porque esses gastos fortalecem a capacidade das pessoas idosas, promovendo seu bem-estar e tendo retorno direto na medida em que geram mais saúde.

Mesmo os gastos com cuidados de longo prazo para pessoas que já apresentam perdas significativas devem ser considerados como investimentos, pois, além de ajudarem essas pessoas a manter uma vida digna, contribuirão para que seus familiares se mantenham no mercado de trabalho.

Transformação no modo de operar dos sistemas de saúde

As novas tendências do envelhecimento exigirão uma ampla transformação na forma de organização e operação dos sistemas de saúde. Esses sistemas, hoje organizados basicamente segundo o modelo curativo, precisarão ser reestruturados para a prestação de cuidados integrais, com foco em adultos mais maduros ou idosos.

Segundo o Relatório, os serviços de saúde não podem continuar buscando apenas a cura de condições ou sintomas agudos e operando sem a devida coordenação entre os profissionais da saúde. Eles precisarão se organizar em torno das necessidades e preferências da população, compreender as necessidades das pessoas mais velhas e atuar junto às famílias e comunidades. O foco não deverá ser apenas nas incapacidades, mas sobretudo nas capacidades intrínsecas das pessoas que possam ser preservadas ou fortalecidas. Todos os profissionais de saúde deverão ter habilidades gerontológicas e geriátricas básicas, visão de saúde integral, capacidade de comunicação e disposição para o trabalho em equipe.

Certamente, aqui reside um enorme desafio para o sistema de saúde público brasileiro que, refletindo uma tendência mundial, não está organizado para oferecer cuidados continuados para incapacidades ou doenças crônicas e para promover o envelhecimento saudável.

A chamada regulação dos serviços de saúde (articulação entre equipes e serviços locais e regionais para que seja possível um atendimento mais efetivo) é um dos maiores desafios para o aprimoramento do Sistema Único de Saúde (SUS). A Estratégia de Saúde da Família é orientada pelo conceito de aproximação dos serviços de saúde ao cotidiano das famílias, estando, do ponto de vista conceitual, alinhada com as recomendações do relatório da OMS. Porém, sua consolidação ainda encontra dificuldades em face das desigualdades regionais e da permanência de uma lógica de trabalho da saúde baseada na especialização, na fragmentação dos serviços e na falta de articulação entre a saúde e outras políticas setoriais.

Segundo o Conselho Federal de Medicina, existem cerca de 1.000 geriatras no Brasil, o que representa uma média de um geriatra para cada 20.000 idosos. Estima-se que mais de 40% desses especialistas estão situados no Estado de São Paulo. Diagnósticos realizados por Conselhos Municipais dos Direitos do Idoso em municípios de pequeno e médio porte de diferentes Estados têm confirmado que os profissionais das Unidades Básicas de Saúde não têm formação adequada na área de envelhecimento e saúde.

Essas dificuldades são conhecidas e precisam ser consideradas para que seja possível empreender esforços para reorganizar o sistema de saúde brasileiro e aproximá-lo das importantes recomendações do Relatório da OMS. Caso contrário, documentos desse tipo podem acabar servindo apenas para reafirmar a precariedade de nossas políticas públicas.

Acesse aqui o resumo do Relatório Mundial de Envelhecimento e Saúde – OMS, 2015