A Lei 13.019/2014 e a formação de parcerias baseadas em Fundos Públicos

Fabio Ribas
07/11/2018

A Lei 13.019/2014, conhecida como Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC), definiu novas regras para parcerias a serem formadas entre o Estado e as Organizações da Sociedade Civil Sem Fins Lucrativos.

O MROSC está vigorando para os municípios brasileiros desde janeiro de 2017. Um ponto que tem gerado dúvidas em muitos municípios é a forma de aplicação das normas dessa lei para a formação de parcerias que envolvam repasses de recursos dos Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente ou dos Fundos dos Direitos da Pessoa Idosa para organizações da sociedade civil (OSCs).

Para dirimir essas dúvidas, a primeira norma do MROSC a ser analisada com atenção é o artigo 2º-A, segundo o qual “as parcerias disciplinadas nesta Lei respeitarão, em todos os seus aspectos, as normas específicas das políticas públicas setoriais relativas ao objeto da parceria e as respectivas instâncias de pactuação e deliberação”. Considerando que os Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente e os Conselhos dos Direitos da Pessoa Idosa são instâncias de deliberação sobre o emprego dos recursos dos Fundos por eles controlados, fica claro que eles devem deliberar sobre parcerias que envolvam transferências de recursos para OSCs. Vale lembrar que, em sintonia com determinações expressas no Estatuto da Criança e do Adolescente e no Estatuto do Idoso, a imensa maioria dos Conselhos Estaduais e dos Conselhos Municipais que controlam as políticas direcionadas a esses públicos estão definidos nas leis estaduais ou municipais que os instituíram como responsáveis pela deliberação e controle do emprego dos recursos disponíveis em seus respectivos Fundos.

O artigo 27, § 1º do MROSC estabelece que, na etapa de chamamento público para a seleção das OSCs que executarão ações priorizadas pela Administração Pública, as propostas apresentadas pelas organizações “serão julgadas por uma comissão de seleção previamente designada, nos termos desta Lei, ou constituída pelo respectivo conselho gestor, se o projeto for financiado com recursos de fundos específicos”. Ou seja, esta norma deixa claro que os Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente e os Conselhos dos Direitos da Pessoa Idosa devem, necessariamente, compor as comissões que farão a seleção de OSCs que poderão receber recursos dos Fundos por eles controlados.

O artigo 59, § 2o, do MROSC, que versa sobre o processo de monitoramento e avaliação das parcerias que venham a ser celebradas, estabelece que “no caso de parcerias financiadas com recursos de fundos específicos, o monitoramento e a avaliação serão realizados pelos respectivos conselhos gestores, respeitadas as exigências desta Lei”. Ou seja, aqui também não resta dúvida quanto ao fato de que os Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente e os Conselhos dos Direitos da Pessoa Idosa devem integrar as comissões que acompanharão e avaliarão o desenvolvimento e os resultados das parcerias que venham a ser executadas com base em recursos dos Fundos por eles controlados.

Apesar dessas indicações bastante claras do MROSC, várias Prefeituras Municipais têm elaborado decretos regulamentando a Lei 13.019/2014 em âmbito local, que não preveem a participação dos Conselhos nas comissões. Em alguns casos, o Conselho é mencionado apenas como integrante da comissão que fará o monitoramento e avaliação de parcerias celebradas, mas não da comissão que será responsável pela seleção das OSCs.

O principal argumento aventado pelas Prefeituras Municipais para a exclusão da participação dos Conselhos na comissão de seleção é o fato de que os Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente e os Conselhos dos Direitos da Pessoa Idosa são integrados por representantes de organizações da sociedade civil que têm interesse na formação de parcerias e que, desta forma, devem ser impedidos de participar de processos de escolha das OSCs que receberão recursos provenientes desses Fundos. No entanto, aqui também a norma a ser seguida está explicitada no próprio MROSC: o artigo 27, § 2o, aponta que “será impedida de participar da comissão de seleção qualquer pessoa que, nos últimos cinco anos, tenha mantido relação jurídica com, ao menos, uma das entidades participantes do chamamento público”. E o § 3o desse mesmo artigo indica que “configurado o impedimento previsto no § 2o, deverá ser designado membro substituto que possua qualificação equivalente à do substituído”. Ou seja, caso algum representante do Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente ou do Conselho dos Direitos da Pessoa Idosa seja membro de uma OSC que esteja participando de um processo de chamamento público, essa OSC não poderá estar representada na comissão de seleção, devendo o respectivo Conselho designar outro de seus membros para participar da comissão de seleção, que não seja vinculado a qualquer OSC que esteja participando do processo seletivo em questão.

Em suma, uma leitura atenta do MROSC revela que não há argumentos que possam justificar a exclusão da participação dos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente e dos Conselhos dos Direitos da Pessoa Idosa nos processos de definição e de monitoramento de parcerias que envolvam transferências para OSCs de recursos dos Fundos por eles controlados.

Acesse aqui o texto completo da Lei 13.019/2014